Fieldbus é um termo genérico para uma série de redes digitais industriais que incluem Foundation Fieldbus, Profibus,
Hart, Ethernet, DeviceNet, Modbus, etc. Os fieldbuses – ou protocolos de comunicação – são usados para comunicação
dos instrumentos de campo aos sistemas de controle,
sistemas de monitoração e mesmo ao nível corporativo.
No passado, os instrumentos de campo eram ligados
aos sistemas de controle via 4-20mA, analógico e cabeado.
Uma boa solução para transmitir informações e variáveis
do processo do instrumento para o sistema de controle
mas com capacidades limitadas – de forma simplificada,
permite comunicar do transmissor ao sistema de controle,
numa única direção do sinal (no sentido da entrada de
sinal neste caso). Aí surgiu o Hart que tem a vantagem de
coexistir com o 4-20mA e estabelecer uma ligação de mão
dupla entre transmissores e sistema de controle. Essa ligação
permite troca de dados para monitoramento, calibração
e diagnóstico. Mas também tem limitações.
Surgiram então buses dedicados como o Profibus e o
FF, oferecendo mais velocidade e capacidades. Mas esses
novos buses não usam o mesmo cabeamento do 4-20mA
e do Hart, precisam de cabos especiais, bem como de
componentes e ferramentas específicas. Entenda-se que
o cabo de um fieldbus transmite dados de acordo com
as características do meio físico utilizado (frequência, impedância,
etc.) e dependendo destas características ele
precisa ter uma construção diferente - por este motivo os
cabos precisam ser especiais para cada tipo de fieldbus.
Marcos Fonseca, gerente sênior da Accenture, lembra
que os cabos são diferentes porque cada
rede já nasce com sua especificação de meio
físico. “A rede AS-i, por exemplo, foi inventada
com cabo chato polarizado, de dois fios, feito
de tal forma que se torna impossível invertê-lo
no campo (filosofia Poka-Yoke)”.
As vantagens da fibra óptica são a maior
imunidade a ruídos e as distâncias a que se consegue
chegar com as informações; em geral os
fieldbuses utilizados em plantas de processo têm distâncias
pequenas, mas ainda assim existe um grande uso da fibra óptica devido a sua imunidade a ruídos.
Então, o próximo passo foram as redes baseadas em
Ethernet industrial – Profisafe, HSE, EthernetIP, etc. e o wireless
foi um passo natural. As plantas usam os buses para
melhorar produtividade através de medições mais precisas
das condições de operação: o tipo de comunicação que se
estabelece com os fieldbuses gera maior produtividade e
confiabilidade. A grande vantagem dos buses seria o acesso às informações de diagnóstico – os instrumentos de campo
requerem calibração e verificação periódicas e os buses
podem ajudar de duas maneiras nisso. Primeiro, eles dão
acesso aos parâmetros que indicam quando a calibração
ou outra ação é necessária nos elementos de campo.
Depois, os buses permitem calibração e coleta de
dados local e remotamente, automaticamente – evitando
erros e dando mais segurança às pessoas. E as redes de
buses podem se ligar a bibliotecas que alimentam o sistema
de gerenciamento do ciclo de vida dos instrumentos
e do próprio sistema. As informações também alimentam
a manutenção preditiva. Com o 4-20mA os operadores
tinham que reagir aos acontecimentos; agora os buses
disponibilizam ferramentas que predizem possíveis problemas,
podendo evitar catástrofes.
Infelizmente, não existe no Brasil levantamento estatístico
sobre a utilização dos protocolos de comunicação.
Constantino Seixas, CTO da Accenture, afirma que é preciso uma entidade isenta que tenha confiança
dos usuários e fornecedores para fazer esses
levantamentos. Em nível internacional, as fornecedoras
notificam a quantidade de equipamentos
que venderam ao mercado; no Brasil a
Abinee faz levantamento semelhante de forma
macro, não classificando por tipo de protocolo. “Os protocolos são normatizados por uma
entidade internacional, e isso significa que existe
um padrão publicado, um documento.
No caso do OPC,
por exemplo, existe uma normatização e quando se quer
fazer um produto compatível, segue-se a especificação; a
OPC Foundation não certificava produtos e algumas empresas
lançaram pacotes com compliances que geravam certificados
de mais ou menos aderência ao padrão – porque não
se precisa implementar 100% da norma, o produto pode
não implementar por exemplo um conceito de array (que lê maior quantidade de informação). Mas a OPC Foundation
percebeu que era desejável que ela mesma certificasse também,
e passou a fazer isso”, exemplifica Constantino.
Quando uma entidade define um protocolo está mais
preocupada em garantir a interoperabilidade dos instrumentos
do que certificar seu uso.
Quem faz certificação para aplicação
são entidades ligadas a indústria; seria candidata a isso
a ANP no setor de petróleo por exemplo, para garantir que
todas as aplicações ligadas a sua área atendessem a requisitos
mínimos, sugerindo uma lista de protocolos homologados
para utilização no setor de oil & gas, por exemplo, como está acontecendo na tecnologia de smart grid, onde estão fazendo
um levantamento para saber quais protocolos poderiam ser
usados com interoperabilidade. Um grupo ligado ao smart
grid contratou o National Institute of Standards and Technology – NIST para fazer um estudo completo, incluindo um levantamento
dos protocolos que poderiam ser usados no setor.
Isso gerou um relatório que listou vários protocolos indicados/
desejáveis, mas que requerem homologação.
Mesmo o OPC UA, padronizado, prestes a se tornar
uma norma IEC daqui a um ano, aparece apenas como
possibilidade de protocolo a ser usado, como uma alternativa
interessante. Mas o NIST não homologou nenhum
deles (veja exemplos de tabelas do trabalho do NIST na
próxima página), apenas listou possibilidades...
O NIST elaborou vários levantamentos para ajudar o
grupo do Smart Grid, como o Guide to industrial control systems
security, com várias arquiteturas possíveis. “Esse cuidado
com o smart grid é uma postura nova. O estudo da
proteção intrínseca aos protocolos, detecção e correção de
erros que funcionam em determinadas situações é importante,
mas vale lembra que a aplicação é crítica. Pode-se ter
um protocolo perfeito, mas que num sistema diferente, se
integra criando falhas de segurança”, comenta Constantino.
Isso porque qualquer tecnologia pode ser uma solução
para A e não ser para B. Quando surgiu o OPC, por
exemplo, o mercado tinha dúvidas se ele teria velocidade
e performance suficiente para aplicações mais críticas. A
experiência hoje é que ele se comporta de maneira bastante
confiável para muitas aplicações, mas o setor elétrico,
por exemplo, tem seus protocolos típicos, bem como
o setor de aviação e assim por diante.
Segundo Augusto Pereira, gerente de Marketing da
Pepper+Fuchs e da Foundation Fieldbus no país,
o market share para os protocolos deve ser analisado “por tipo de mercado, o que nos leva a
acreditar que o FF predomina nos mercados de
química, petroquímica, óleo e gás; o Profibus DP,
nos mercados de CCMs inteligentes na mineração,
etanol, papel e celulose – com algumas iniciativas
recentes em química, petroquímica, óleo
e gás.
Já o Profibus PA domina nos mercados de
mineração e etanol, sem nos esquecermos das indústrias de
origem alemã de qualquer mercado! O DeviceNet predomina
onde a Rockwell Automation vende seus PLCs, na indústria automobilística
e máquinas de manufatura. Quanto ao Ethernet,
devemos entender que seu uso está crescendo mas não para a
instrumentação e sim para a interligação de SDCDs e PLCs e
também com a chegada da Norma IEC 61850, para aplicações
em CCMs e subestações de elétrica. O Modbus vem perdendo
espaço para o Profibus DP e o Ethernet devido a baixa velocidade
e quantidade de nós por segmento, 31”. Augusto frisa
que o 4-20 mA + Hart ainda é muito utilizado, principalmente
quando o cliente é conservador pois apresentam menos riscos
e menos treinamento.
Marcos Peluso, especialista da Emerson
Process, pede, contudo, cuidado com as incompatibilidades
entre o Hart 7 e as versões anteriores. “Implementar qualquer um dos fieldbuses pode gerar
frustração quando não se alinham as expectativas da
tecnologia com as dos usuários; quando se escolhe mal
o tipo de bus; quando a escolha gera incompatibilidade
entre o sistema de controle e o sistema de gerenciamento
de informações; quando se subestima a complexidade da
tecnologia e quando se subutiliza as capacidades do bus”,
ressalta Carlos Fernando Albuquerque, da Siemens.
O melhor caminho talvez seja aquele tomado pela
Deten, pioneira na utilização do fieldbus foundation: começar
com uma rede isolada num laboratório ou, como foi o
caso, na área de utilidades. Utilizar um bus assim é bom
para aprender a lidar com a tecnologia e pegar os macetes
de algumas conexões inter-marcas. Ir acrescentando instrumentos é um jeito de vivenciar uma característica dos buses
que não existe no 4-20mA: eles são feitos para se expandir.
E então, quando houver mais segurança, implantar os buses
em larga escala trará, de certo, benefícios em larga escala.
Carlos Fernando lembra que os buses possuem características
e ferramentas bem diferentes do 4-20 e pedem treinamento. As novas redes pedem modelagem e testes
de performance da própria rede, das malhas, dos cabos,
com atenção especial à parte elétrica e suas interferências.
Um erro comum é a má distribuição de nós e spurs.
Então, o conhecimento do usuário é desejável, mas
a escolha do parceiro é determinante para o sucesso da
implementação. Inclusive para saber que alguns instrumentos
podem se ligar diretamente aos sistemas de TI,
reduzindo custos dos equipamentos e softwares intermediários.
Isso porque algumas aplicações não pedem atualização
de milissegundos ou comportamento determinístico – em algumas instalações a maioria dos instrumentos
não está associada a funções de controle em tempo real.
Há dez anos, a maior justificativa para se implantar
um fieldbus era que ele usava menos cabos; outra justificativa
comum para todos os buses é a cultura de gerenciamento
de ativos – e a economia - em não repor partes
que não precisam ser repostas, trocar instrumentos que
vão apresentar defeitos antes de um problema - é grande,
mas não é o suficiente para convencer pelo payback
num projeto brownfield. Para os greenfield, menos cabos,
menos manutenção e rápido comissionamento podem
ajudar a vender a idéia.
Os primeiros usuários chamam a atenção para o fato de que estar on line permanentemente
pode ser a maior justificativa porque essa condição traz
um conhecimento do processo e da planta jamais imaginado.
E os buses todos trazem muitas melhorias, com
excelentes perfomances se bem aplicados, como mostra a
tabela que resume um trabalho realizado na África.
Deveriam influenciar no processo de escolha a engenharia,
a instalação e a operação, que não quer apenas
saber qual a temperatura ou a pressão que o transmissor
está lendo, quer tirar o máximo desse transmissor,
enquanto as informações de calibração que possam não
ser vistas de tempos em tempos, ficam armazenadas no
instrumento, à mão para quando for preciso.
E o bom da tecnologia é que ela está sempre nos
oferecendo mais. Os buses foram atrás de incluir em
seus repertórios as necessidades de segurança, os desejos
de uma ligação mais familiar com a TI para criar
suas versões Ethernet, a dificuldade de vencer as longas
distâncias com o wireless... Ainda não são
todos interoperáveis e plug´play, mas estão
trabalhando para isso, num esforço que, se
encontra revezes comerciais, tem tudo pra
dar mais que certo, numa fórmula que se
pode resumir como ECT (EDDL Cooperation
Team)+FDT+OPC=FDI.
Mas Carlos Fernando Albuquerque, da Siemens, lembra que os protocolos não têm nada a ver com os
formatos de arquivo para gerenciamento de ativos. Então, na prática,
tanto EDDL quanto FTP podem ser utilizados por qualquer
protocolo – ressaltando que no caso do FF em particular, ele usa
EDDL para a configuração da rede. Mas nem todos os fabricantes
suportam os dois. Uma comparação típica seria: usar milímetro
ou polegada? A medida é a mesma, mas essa diferença acaba
obrigando os usuários e mesmo os fabricantes a ter duas chaves,
no mínimo.
Vale lembrar que a razão de existir do grupo FDT é esse padrão
e ele vai continuar a existir. “O FDT Group apóia a FDI porque é uma demanda do usuário, mas deve continuar com versões
do FDT as mais parecidas possíveis do FDI para que, se houver
uma demanda de maior compatibilidade, ele se encaixe sem
maiores problemas. Essa é a idéia, mas a gente só vai ver se isso
funciona mesmo quando os primeiros interpretadores e produtos
FDI saírem... daqui a alguns meses”, pontua Carlos Fernando.
Constantino lembra que a topologia também gera preferências
e é uma limitação inerente a cada rede, cada uma tem sua
vantagem e desvantagem. “O padrão Ethernet, por exemplo, nasceu
como barramento, mas hoje possibilita diferentes possibilidades
com os switches. E todos os protocolos criaram topologias
compatíveis com a Ethernet. Em qualquer protocolo de última
geração, se pode criar uma topologia equivalente. A tendência é que migrem para Ethernet e assumam suas características de
topologia”.
Segundo Augusto, na questão topologia, a única tecnologia
de protocolo que possibilita hoje a descentralização do controle é a Fieldbus Foundation, pois neste caso pode-se escolher manter
um controle centralizado no PLC ou no SDCD; todos os outros
buses precisam ter um controle centralizado e com isto o segmento
fica sendo somente utilizado como um via de transporte de
informações bidirecional. O desempenho de um controle passa
pela correta escolha do protocolo para o tipo e para as demandas
de uma aplicação especifica.
A questão de segurança é tratada por normas especificas
como a ISA S84 e mais recentemente pelas IEC 61511 e FFSIS,
nem todas prontas. É uma questão de tempo que os buses todos
tenham também SIS. E ainda FISCO, FNICO... Não é mesmo uma
decisão fácil. Em geral a tomada de decisão de se desenvolver
um projeto com uma ou outra tecnologia é feita a pelo menos
duas mãos: o usuário e o projetista. Nesse momento é preciso ter
muita calma e fazer um estudo profundo, levando-se em consideração
que um projeto que está se iniciando hoje deve atender
as demandas de produção de uma planta para os próximos 20 ou
30 anos. “As técnicas de controle de processo e de manutenção
devem ser pensadas neste sentido”, frisa Augusto.
A análise é bem mais ampla do que optar por uma tecnologia
ou uma solução, a utilização de um ou mais protocolos deve ser
pensada como uma decisão estratégica para a empresa. “Em minha opinião, nenhuma razão técnica sustenta o uso
de 4-20 mA hoje em dia nas plataformas de petróleo, por exemplo.
Podemos ver nos dias de hoje como o controle do processo
de extração numa plataforma é perigoso e a automação e a instrumentação
desde que bem utilizadas com seus protocolos digitais
podem ajudar a aumentar a qualidade e a segurança do controle
da plataforma”, comenta Augusto.
A saída para grandes parques rodando no 4-20 mA seria então o Hart, que facilitaria a entrada desses sites na “modernidade” via WirelesHart? Carlos Fernando lembra que o
wireless sozinho não muda nada no mercado de protocolos
tecnicamente falando porque os padrões de rede e os
padrões de gerenciamento de ativos são coisas diferentes. “Os padrões de gerenciamento de ativos usam serviços dos
padrões de rede para fazer o acesso aos ativos: havendo
serviço, tudo funciona. O WiHart não pede nenhuma
modificação sensível nessa disputa e até mesmo pelo fato
dele ser baseado no Hart, os serviços desse protocolo aceitam
EDDL e DTM – é só garantir que o gateway que lê o
WiHart se comunique com a ferramenta do gerenciamento
de ativos.
Do mesmo modo o ISA 100. O wireless é uma
rede em paralelo aos FF, Profibus, etc.”. No caso do novo
wireless chinês, seu peso é que os fornecedores terão que
incluí-lo no portfólio para atender o mercado chinês – extrapolar
isso ainda não. A China ainda não tem força como
fornecedora, mas tem como compradora. O bom disso é
que a Hart Foundation já está montando laboratório na
China para trabalhar em conjunto com o instituto chinês
responsável pela norma daquele país.
O Hart pode, por exemplo, ser encapsulado no Profibus
que tem mecanismo padronizado e tanto processa informação
cíclica quanto acíclica. No WiHart o vínculo nãoé feito no nível do Profibus; o gateway do WiHart se comunica
diretamente ao SDCD e não há uma relação direta Profibus/Wireless, não existe um Proxy Profibus/WirelessHart. Tanto
um como outro se conectam direto a CPU, ao SDCD. O
máximo que se pode compartilhar é um barramento Ethernet
para que o gateway fale diretamente com o sistema de
controle. “O sistema de controle acaba sendo um guarda
chuva pra tudo que está embaixo, no campo.
Então, quanto
mais buses e tecnologias um sistema de controle é capaz
de suportar de forma nativa mais ele simplifica a vida. Mas,
para maior confiança na escolha de um ou outro protocolo, é interessante visitar as Plantas de Referências e apresentar
um estudo de ganhos”, comenta Carlos Fernando.
A cultura de uso é um fator primordial nos diversos
segmentos e alguns são mesmo mais tradicionalistas que
outros, como o de papel e celulose – que também começa
a inserir as novas tecnologias, como por exemplo os
projetos da Voith Paper que é pró ativa em oferecer as
vantagens de novas tecnologias com garantia.
Os prazos
muito curtos para a execução dos projetos – que têm que
se pagar rapidamente – pode ser uma das causas para
que os epcistas evitem incluir novos conceitos. A cultura
de gerenciamento de ativos tem papel fundamental na
expansão do uso dos protocolos (FF, Profibus, etc) porque
mostra que o 4-20mA, apesar de confiável e conhecido,
torna a manutenção cega sem um Hart, por exemplo.
“A escolha de protocolos é um assunto tão importante
e frequente no meu dia-a-dia que eu lancei um
novo curso, “Análise comparativa dos protocolos digitais
para aplicação em projetos de automação” onde eu trato
de todos os detalhes dos protocolos mais importantes e
como se pode chegar à escolha mais adequada de um determinado
protocolo para uma determinada aplicação”,
diz Augusto Pereira.
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