Revista Controle & Instrumentação – Edição nº 117 – 2006
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Maior projeto de automação hídrica do país entra em operação
Sistema monitora 27 estações, dez poços e 36 reservatórios

Em Sergipe entrou em operação um dos maiores e mais sofisticados projetos de automação hídrica já realizados no Brasil. Trata-se do PróÁgua, um programa de desenvolvimento de recursos hídricos para o semi-árido brasileiro que busca garantir a ampliação de oferta de água de boa qualidade, com uso racional, de tal modo que sua escassez relativa não continue a ser impeditivo para o desenvolvimento sustentável da região. O PróÁgua – programa que envolve recursos da ordem de US$ 330 mil, financiados pelo Banco Mundial (60%), pelo JBIC (21%) e pelos Governos estaduais envolvidos, mais o Governo Federal – estabelece um processo sustentável de administração, operação e manutenção da infra-estrutura de abastecimento de água.

A parte do Projeto no Estado de Sergipe recebeu um sistema automatizado desenvolvido e implantado pela Atos Automação que venceu a licitação de R$ 7,4 milhões, em 2004. Segundo Daniel Andrade, Gerente de Engenharia de Aplicações da Atos, o PróÁgua impacta positivamente cerca de 80% da população daquele Estado e se destina a levar água tratada a pessoas que por vezes passaram a vida acostumadas a beber de cacimbas barrentas.

O prazo inicialmente previsto para a conclusão das obras era de 210 dias mas, como a parte de edificação, incluída em outra licitação, sofreu atraso, isso repercutiu em cadeia em todos os outros trabalhos do Projeto, em Sergipe, que levou quase 24 meses. Em parceria com a Saga Nordeste, a Atos foi a responsável pela automação dos sistemas de adutoras de Piauitinga e do Agreste, no interior de Sergipe, que acaba de entrar em fase operacional.

A Atos alocou diretamente em Sergipe, para esse trabalho, 50 técnicos que puderam perceber, também, a importância social da tarefa já na contagem regressiva – que terminou no último mês de junho –, pois cerca de 1,3 milhão de pessoas são as principais beneficiárias do projeto: a ampliação da oferta de água potável para o equivalente a 25% da área de Sergipe.

No local, a Atos implantou uma das mais sofisticadas redes de controle automático de processos já criada pela engenharia do País. Espalhados geograficamente pelo Estado e conectados entre si por uma rede de telemetria, 100 Controladores Lógicos Programáveis Atos MPC4004 são agora responsáveis pelo salto qualitativo da vida de 8 em cada 10 sergipanos. A telemetria envia os dados por rádio digital – Rádios Modem Motorola – porque, além de serem prescritos na licitação, asseguram a segurança dos dados transmitidos.

“O sistema de automação faz a monitoração e o controle de 27 estações elevatórias de água, dez poços artesianos e 36 reservatórios. As informações do processo são transmitidas através de sinais de rádio e centralizadas em dois Centros de Controle Operacional, permitindo aos operadores o acompanhamento em tempo real do que ocorre ao longo de todo o sistema”, revela Daniel Andrade. Nos Centros de Controle Operacionais trabalham um operador e um supervisor e eles estão interligados por unidades remotas através dos rádio modems e ao Centro de Controle Geral na capital do Estado, em Aracajú, através da Intranet da Companhia de Saneamento.

Os registros das variáveis – como o nível dos reservatórios, a vazão e a pressão da rede, a tensão e a corrente, além de outras – acontecem a uma base determinada de tempo; variáveis como a confirmação da partida dos motores ou alarmes são transmitidas em cinco segundos, no máximo. Para a medição de nível, por exemplo, são utilizados sensores hidrostáticos (Hytronics), bem como medidores de pressão. Por apresentar 54 parâmetros elétricos, são utilizados medidores de grandeza elétrica MIB que, interligados ao CLP via Modbus, permitem extensa fonte de recursos para análise da qualidade da rede elétrica, bem como das condições de operação dos motores elétricos – condição fundamental para se criar métricas de ações para a redução de queima de motores e conseqüente redução dos custos operacionais. A Atos também utilizou sensores passivos de presença para monitorar possíveis invasões da área, para garantir a segurança patrimonial.

Energia solar alimenta equipamentos em regiões remotas
O Projeto PróÁgua se traduz em água limpa, produzida sem desperdício, para milhares de famílias que antes se abasteciam em cacimbas e poços sem mínimas condições de higiene. E, trabalhando por tanto tempo nas áreas afetadas pelo Projeto, Daniel Andrade conta que ele e a equipe da Atos ficaram tocados com a extensão humana do projeto. “É impossível participar de uma implantação com cunho social e ecológico tão flagrantes sem se envolver pessoalmente”, diz Andrade, que se acostumou a enfrentar o sol constante e o calor que facilmente supera os 40° C nas áreas do agreste nordestino. Aliás, o meio ambiente hostil não representou problemas para os equipamentos da empresa já que eles atendem a norma IEC 68-21 que pede ensaios climáticos em um range de temperatura que varia de – 5oC a +70oC.

Munida de informações recolhidas com trabalhadores que controlavam manualmente os reservatórios e as estações de elevação então existentes, a equipe da Atos costurou um sistema que controla cada detalhe da operação - levando em conta tanto a expertise tecnológica da empresa quanto a experiência prática dos operadores e as variáveis ambientais do processo. Essa é uma parte fundamental de qualquer sistema: aquisições periódicas de dados são uma fonte imprescindível de análise e consulta. O histórico do reservatório, por exemplo, pode mostrar não apenas o que acontece mas fornece dados para a elaboração de gráficos de tendências. Pode, também, sobrepor curvas como a do nível do reservatório com a da bomba elevatória. Hoje, esse confronto permite uma análise do tempo de recuperação do nível do reservatório em função do bombeamento. Antes, com coletas manuais de dados e medições precárias, não era possível uma forma sistêmica confiável de análise.

O novo sistema é alimentado por centenas de sensores que não só dizem onde e quando há necessidade de maior ou menor produção de água como ainda alerta para a ocorrência de problemas, como vazamento em um duto ou quebras potenciais. Dentro do conceito de sustentabilidade, a automação permite que a água seja produzida – entenda-se bombeada, tratada e estocada - apenas em horários nos quais a eletricidade é mais barata.
Conjunto Medidor de nível
O sistema também tem inteligência para não permitir que se trate água além da demanda. “Em processos convencionais a água é tratada e, se não há consumo, é devolvida ao rio ou reservatório”, explica Andrade. Esse tipo de detalhe mostra o refinamento para tornar o sistema o mais ambientalmente amigável possível com a atual tecnologia.

Outro exemplo na mesma direção é o da geração de energia elétrica para alimentar CLPs e outros equipamentos em regiões remotas. Ao visitar algumas áreas onde deveriam ser instalados os equipamentos eletrônicos de controle, os técnicos descobriram que muitas delas não contavam com eletricidade. “Como fomos lá para resolver problemas e não para criar novos, acabamos criando soluções para questões que sequer estavam no escopo do projeto”, conta Daniel Andrade. No caso da energia, a solução foi o desenvolvimento em prazo recorde de geradores solares de eletricidade. Como o consumo é relativamente pequeno, algo em torno de 100W, a equipe optou por células de energia solar da Solar Brasil: foi uma solução simples, confiável e de custo baixo.

Segundo Daniel, essas e outras soluções têm importância não apenas local. Muitas já estão sendo somadas ao mix tecnológico da Atos e ajudarão a enfrentar problemas semelhantes que, longe do interior de Sergipe, começam a afetar populações de outras regiões do País. A importância ganha contornos ainda maiores se levado em conta que, dos 1.386 milhões de quilômetros cúbicos de água disponíveis na Terra, só 2,5% são de água doce. Embora esse percentual venha se mantendo relativamente estável ao longo da história, a população mundial saltou para mais de seis bilhões hoje em dia. E o consumo de água, agravado pela poluição, triplicou nos últimos cinqüenta anos.
 


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