Revista Controle & Instrumentação – Edição nº 197 – 2014



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Mais Real que o Rei

 
 

Segundo o Sinait – Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, o Brasil está em 4º lugar no ranking de acidentes. Um levantamento de 2012 e 2013, aponta que 12 mil acidentes de trabalho graves e fatais ocorrem por ano, sendo que 42% estão relacionados às máquinas e equipamentos, 50% envolvem acidentes graves e fatais e 30% são fatais. Diante desse cenário, clara a importância de uma norma para segurança.
“A NR-12 é um regulamento que estabelece requisitos mínimos para o trabalho seguro em máquinas e equipamentos abrangendo desde o projeto até o descarte das máquinas e as diversas interações com os trabalhadores em todas as fases de utilização. Para tanto, afirma e divulga as boas técnicas consolidadas em segurança de máquinas representadas pelas normas técnicas, buscando a harmonização entre as normas técnicas e o regulamento e uma aproximação de práticas internacionalmente aceitas”, afirma Rodrigo Cauduro Roscani, engenheiro mecânico e pesquisador da Fundacentro, em Campinas/SP.
O responsável pela NR-12 na Abimaq, Lourenço Righetti, acrescenta que “a norma não está errada. Ela é, talvez, por demais interpretativa, o que não se costuma ver numa regulamentação”.
Uma lida na norma mostra que ela quer dizer “como” construir uma máquina. É mais impositiva que outras com as quais se costuma lidar. Quase desconsidera a capacidade do profissional que desenha uma máquina. A NR-12 segue o que já está determinado na Constituição, e antes ainda, na CLT - Lei 6514 de dezembro de 1977 (que continua valendo e diz que é proibido fabricar máquinas inseguras), a Portaria de 1978 que colocou as normas regulamentadoras em destaque e na convenção 119 da OIT, ratificada pelo Brasil e válida em todo o território nacional desde 1993. “Não há como tratá-la como novidade. A NR-12 em seu corpo e por referência cruzada com outras NRs trata de todo os tipos de riscos no ambiente de trabalho além dos elétricos e mecânicos, como riscos físicos, químicos, ergonômicos, etc. que são igualmente considerados na Europa”, diz Aitemar Fernandes, engenheiro habilitado e diretor geral da Pilz – a empresa possui um guia em inglês para facilitar trabalhos de importação de máquinas, “ NR-12: safety in machinery & work equipment brazilian federal regulation”.
Além dos requisitos para a obtenção da marca CE, os fabricantes europeus devem seguir outras diretivas, regulamentações e normas que juntas se equivalem – ou deveriam - ao requerido pela NR-12. Um item em que não há concordância é o solicitado no capitulo “Sinalização” da NR-12 que exige que toda a sinalização da máquina seja na língua portuguesa- Brasil, mas é uma questão de língua. Conceitualmente não deveria haver nenhuma diferença entre o que é requerido na Europa e no Brasil.
Mas aparentemente, há.
“Conceitualmente, tudo o que é exigido pela NR-12 também o é na Europa. Quem diz que a máquina serve para a Europa mas não serve para Brasil, ou coisa semelhante esquece um pequeno detalhe: os fabricantes europeus são obrigados a atender os requisitos para a obtenção da marca CE e seguir diretivas complementares somente para as máquinas fornecidas para os países membros da União Europeia e não para as que são fornecidas para países não membros, como o Brasil”, pontua Aitemar Fernandes que mantém um grupo no Linkedin voltado ao estudo e discussão da NR-12.
Uma busca pelas normas norte americanas e europeias para máquinas nos levou a um quadro (veja box na página 46) com muitas delas, que se aplicam ou não às duas regiões.
Roscani salienta que um regulamento técnico é um documento adotado por uma autoridade com poder legal para tanto, que contém regras de caráter obrigatório e que estabelece requisitos técnicos, seja diretamente, seja pela referência a normas técnicas ou a incorporação do seu conteúdo, no todo ou em parte, sendo de observância compulsória.
Os países possuem regulamentos que visam assegurar aspectos relativos à saúde, à segurança, ao meio ambiente e relações de consumo. Em um mundo globalizado, diferentes regulamentos entre Estados, sobre um mesmo tema, podem dificultar o comércio internacional, o que é conhecido como barreira técnica. “São de relevância para o tema tratado na NR-12 as normas ISO e IEC. Contudo, não podemos deixar de levar em conta a normatização nacional”, lembra Roscani.
O que vale aqui é a NR-12; é possível e mais que recomendável exigir do fabricante de uma máquina importada que ele a siga também. Interessante notar que, ao contrário do que se pode pensar, a NR-12 atrapalha as exportações de máquinas brasileiras que não podem ser construídas sem levar em consideração a norma mas que encontram compradores externos que não querem de jeito nenhum nem a parafernália segura nem o custo a ela associado. O setor de máquinas vive uma verdadeira sinuca.

 

Dante Miatelli, do centro de Usinagem Rio Preto, projetou uma máquina que pode trabalhar uma diversidade muito grande de segmentos, desde a área de plástico, até área médico-hospitalar, aeroespacial, ferramentaria, calçados etc.
Para Dante, conhecimentos de mecatrônica foram importantes na hora de desenhar a máquina. “É preciso ter uma estrutura bem dimensionada com capacidade de inibir ruídos, sistema de comunicação versátil e simples para operação e motores que são dimensionados em função da capacidade de remoção de material. A NR12 tornou o projeto mais complexo e para alguns casos, inviável na questão financeira. Quando desenvolvemos um equipamento, não podemos esquecer a manutenção pois a interrupção do funcionamento em função de problemas mecânicos ou elétricos é inevitável. Então, garantir o funcionamento contínuo é primordial e a resposta imediata a uma solicitação de manutenção é fundamental. Por isso o conjunto deve ser desenvolvido de uma forma prática, tornando fácil a realização do reparo por pessoas com pouco conhecimento”

 
E, para piorar, todos os prazos estabelecidos pela Portaria nº 197, de 17 de dezembro de 2010 para o cumprimento da NR-12 estão esgotados, tanto para as máquinas novas quanto para as máquinas usadas (parque de máquinas instaladas no país). Ainda que os prazos estejam estourados, a Abimaq orienta que as empresas devem tomar as seguintes medidas prioritárias: regularizar a empresa no Crea – conforme capítulo 12.123, alínea “d” da NR-12; definir o responsável técnico pela empresa; elaborar o inventário das máquinas e equipamentos – conforme descrito no capítulo 12.153 da NR-12, manter o inventário atualizado com o seguinte conteúdo mínimo, ou seja, com a identificação da máquina e equipamento; sua descrição geral (tipo, modelo, fabricante, ano de fabricação); capacidade, produtividade, tempo de utilização por dia, quantidade de operadores envolvidos na utilização; diagnóstico com relação a NR-12 (avaliação e análise de risco, sistema de segurança da máquina); previsão da adequação; recursos financeiros para a adequação; localização em planta baixa (layout). Deveria ainda fazer a Apreciação de Riscos – conforme capitulo 12.39, alínea “b” da NR-12 e emitir a ART – Anotação de Responsabilidade Técnica – conforme
capitulo 12.39, alínea “a” da NR-12. “Estas são as etapas iniciais de implantação da NR-12 e certamente as que são solicitadas pelos auditores fiscais do trabalho”, lembra o responsável pela NR-12 na Abimaq.
Há diferença na atuação dos auditores nas diferentes regiões do país porque, embora todos tenham sido legalmente aprovados em concurso público, muitos não têm a formação acadêmica compatível para atividades na área industrial, na avaliação de máquinas e equipamentos industriais e sistemas de segurança em máquinas, matéria bastante complexa que requer conhecimentos específicos na área de engenharia.
Na Europa, uma norma diz como a máquina deve funcionar e outra norma diz como o operador deve trabalhar com ela. No Brasil, a NR-12 ainda dita de forma inflexível como deve ser o entorno da máquina, como fazer a manutenção, o transporte, etc., caracterizando a incapacidade de quem já faz essas coisas. E aí pode-se entender bem toda a revolta de quem trabalha direito: na Europa e no Japão existem sistemas de segurança, existem faixas limitando a travessia... e os avisos são respeitados.
A NR-12 parte do princípio que os avisos aqui não serão respeitados, que alguém se colocaria em risco propositalmente e a responsabiliza a empresa, nunca o trabalhador.
Roscani frisa que as normas nacionais são normas técnicas estabelecidas por um organismo nacional de normalização para aplicação num dado país. O governo brasileiro por meio da Resolução Conmetro nº7 de 1998, designou a Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT como foro nacional de normalização – e, portanto, as normas elaboradas pela ABNT, as ABNT NBR, são formalmente reconhecidas como normas brasileiras.
Por definição, uma norma técnica é um documento estabelecido por consenso e aprovado por um organismo reconhecido que fornece, para uso comum e repetitivo, regras, diretrizes ou características para atividades ou para seus resultados, visando à obtenção de um grau ótimo de ordenação em um dado contexto. A ABNT é fundadora da ISO e representante nacional na elaboração e consulta de normas internacionais ISO, assim como IEC, bem como para normas regionais, normas Mercosul (NM), quando uma norma internacional ou regional passa a integrar o acervo nacional é identificada pela sigla ABNT NBR ISO, ABNT NBR NM, ou ainda ABNT NBR NM ISO.
A elaboração e revisão de normas sempre procuram aproximá-las da versão atualizada da norma internacional ou regional sobre o tema. Elas se dividem em normas do tipo A, que tratam de requisitos gerais, normas do tipo B, que tratam de aspectos específicos e normas tipo C, que tratam dos requisitos para um determinado tipo de máquina - onde já foram considerados todos os aspectos contidos nas normas tipo A e B. As normas são elaboradas pela sociedade e por consenso, portanto, temos um volume muito pequeno de normas tipo C, especialmente normas ISO.
Roscani lembra que, durante a elaboração da NR-12, o foco eram os princípios das boas práticas representados pelas normas nacionais, onde foram encontradas algumas normas do tipo A e B com versão ABNT NBR ISO. “Em que pese o contínuo trabalho dos comitês de normalização da ABNT na atualização e ampliação do leque de normalização brasileiro, a quantidade de normas ainda é escassa frente a variabilidade de máquinas existentes”, afirma Roscani.
Escassa... ou seja, os problemas ainda não acabaram.
E, se a norma veio para ficar, não significa que ela é estática. A Fundacentro promoveu um seminário, em maio, com a presidente da Fundação, Maria Amelia Souza Reis, o diretor do Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho da Secretaria de Inspeção do Trabalho/MTE, Rinaldo Marinho Costa Lima e o novo diretor técnico da instituição, Robson Spinelli Gomes.
Maria Amelia salientou que a integração com a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) tem sido importante para discutir sobre a importância de abordar medidas que possibilitem a melhoria do cotidiano do trabalho.
“Políticas públicas são de interesse de todos, tanto dos trabalhadores como dos empregadores. O ministro do Trabalho, Manoel Dias, tem participado de eventos que abordam à SST, além disso, esta instituição é responsável por pesquisas e estudos nesta área. A discussão sobre a norma regulamentadora é importante no sentido de assegurar a segurança e a saúde do trabalhador”.
Rinaldo Marinho comentou que a parceria com a Fundacentro é importante dentro do sistema tripartite.
“Em todas as instâncias a pauta sobre a norma regulamentadora 12 está em evidência. Caminhar em parceria com os empregadores e trabalhadores para que de fato a norma seja aplicada e, desta forma, viabilizar o seu cumprimento, é fundamental para garantir melhorias das condições de trabalho”, diz Rinaldo.
“A minha preocupação é com o cumprimento das normas na sua integridade, não podemos permitir que o mínimo seja feito, isso compromete o setor e leva a um grande número de trabalhadores que estão morrendo por máquinas sem proteção”, salientou Robson Spinelli, doutor em engenharia de produção e mestre em ciências ambientais. Para ele, as normas precisam acompanhar o crescimento do país, o cenário tecnológico e os processos de trabalho. “A construção da Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP) foi um grande avanço, o qual possibilita e garante uma democracia nas discussões entre o setor patronal, trabalhadores e governo em prol da saúde do trabalhador e das condições de trabalho. A prática e a execução das normas regulamentadoras, em especial a NR nº 12, são fundamentais para o nosso país, sobretudo no que diz respeito à prevenção de acidentes”, enfatizou Spinelli.
“São realizadas 150 mil ações de fiscalização de segurança e saúde todo ano, para saber como as normas estão funcionando nas empresas e propor alterações quando necessário. Os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil também entram na fiscalização, os quais existem uma série de convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em que demanda que o país trate das questões que estão inseridas nestas convenções no ambiente de trabalho e sugira modificações e implementações quando necessário”, enfatizou Rinaldo Marinho.
 
Fiscalização da NR 12 em 2013
 

Em 6 de fevereiro de 2014 a CNI protocolou carta junto ao Ministério do Trabalho e Emprego propondo a adoção de algumas premissas: linha de corte temporal para a adequação de máquinas usadas; obrigações distintas para fabricantes e usuários; tratamento diferenciado para as microempresas e empresas de pequeno porte; interdição de máquinas e equipamentos mediante grave e iminente risco devidamente comprovado, por laudo técnico circunstanciado e por ato da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego. Ainda, deveriam ser ampliadas as linhas de financiamento para a renovação do parque de máquinas do Brasil e para a adequação aos requisitos da NR-12 do parque de máquinas instalado no país. Outro ponto a ser analisado é o escarte de máquinas usadas, que não estão adequadas aos requisitos da NR-12 e não podem ser vendidas, devendo ser destruídas. Mas o proprietário deve ter toda a documentação desse descarte – o que é raro e, para ser elaborado, tem custo elevado. Uma sugestão é que tais máquinas poderiam ser recolhidas pelo Estado e o valor desta máquina considerado como parte de pagamento de uma máquina nova. O governo rejeita qualquer revisão ou divisão na NR-12, além da diferenciação para pequenas e micro empresas, ainda que tenha se disposto a discutir outros quesitos.
Segundo Rinaldo, a norma precisava de revisão e a bancada discutiu quatro pontos que teriam de ser contemplados para que as dificuldades das indústrias fossem superadas. Em fevereiro deste ano, a bancada apresentou à comissão tripartite o texto abordando os pontos que deveriam constar na revisão da norma, os quais descrevem sobre a prorrogação dos prazos e situações diferenciadas para micro e pequenas empresas. Além disso, o problema das máquinas usadas com requisitos diferentes e a questão das diferenças entre fabricantes e usuários das empresas que utilizam essas máquinas. A partir daí foi feito análise e, em abril, a comissão reuniu-se para discutir o texto da bancada.
Rinaldo disse que não é possível acatar todos os pontos, mas alguns tópicos foram inseridos na norma. “Mesmo empresas que consigam o prazo de sete anos, terão que seguir o cronograma. Pode-se ganhar competitividade desde que não prejudique a saúde e segurança dos trabalhadores. Podem acontecer estudos de caso a caso para que sejam implantadas as alterações de proteção às máquinas”, enfatiza o diretor.
Rinaldo Marinho salientou durante a sua apresentação que a norma é para assegurar vidas. Disse ainda, que de acordo com o sociólogo José Pastore, os acidentes e doenças do trabalho no Brasil custam mais de R$ 70 bilhões por ano.
São gastos com perda da produção das empresas, despesas previdenciárias e com o Sistema Único de Saúde – SUS.
“O ministério não quer parar a empresa ou atuá-lo, mas resolver os problemas existentes. Ainda temos quatro reuniões agendadas que vai até o mês de agosto deste ano e a solução será trabalhada no consenso”, finaliza Rinaldo.
O médico Zuher Handar, representando a Organização Internacional do Trabalho – OIT, explanou sobre a questão do tripartismo e a Convenção 144 que prevê consultas tripartites sobre Normas Internacionais do Trabalho.
“A OIT é um dos órgãos das Nações Unidas, o qual é o único que tem a composição aonde todas as normas são discutidas no consenso do tripartismo”, salienta Zuher. A convenção foi ratificada no Brasil em 1998, pelo Decreto 2518, de 12 de março, o qual foi aprovado na 61ª Reunião Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra, em 1976. A OIT 119 discorre sobre a proteção de máquinas e o Guia de Boas Práticas em Segurança de Máquinas desenvolvido pela Organização, o qual foi fundamentado na NR-12. “Para o médico é fundamental que o trabalhador e o empregador observem que a nova norma tem que agir na origem do problema. Quem fabrica tem responsabilidade, mas quem compra máquina sem proteção também é responsável”, diz Zuher. Ninguém esclarece se os fabricantes europeus estão atendendo a Convenção nº 119 da OIT e se, em caso afirmativo, como as máquinas deles não atendem aos requisitos da NR-12.
A Abimaq orienta seus associados a seguir rigorosamente as normas, ainda que o texto atual da NR-12 seja muito longo, interpretativo e não siga os conceitos e o modelo das Diretivas Europeias que foram utilizadas como referência na elaboração do texto da Norma; não considera os aspectos da capacitação nem distingue obrigações diferenciadas para fabricantes e para usuários.

 
 
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