Revista Controle & Instrumentação – Edição nº 160– 2010

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Protocolos de comunicação



Fieldbus é um termo genérico para uma série de redes digitais industriais que incluem Foundation Fieldbus, Profibus, Hart, Ethernet, DeviceNet, Modbus, etc. Os fieldbuses – ou protocolos de comunicação – são usados para comunicação dos instrumentos de campo aos sistemas de controle, sistemas de monitoração e mesmo ao nível corporativo. No passado, os instrumentos de campo eram ligados
aos sistemas de controle via 4-20mA, analógico e cabeado.

Uma boa solução para transmitir informações e variáveis do processo do instrumento para o sistema de controle mas com capacidades limitadas – de forma simplificada, permite comunicar do transmissor ao sistema de controle, numa única direção do sinal (no sentido da entrada de sinal neste caso). Aí surgiu o Hart que tem a vantagem de
coexistir com o 4-20mA e estabelecer uma ligação de mão dupla entre transmissores e sistema de controle. Essa ligação permite troca de dados para monitoramento, calibração e diagnóstico. Mas também tem limitações.

Surgiram então buses dedicados como o Profibus e o FF, oferecendo mais velocidade e capacidades. Mas esses novos buses não usam o mesmo cabeamento do 4-20mA e do Hart, precisam de cabos especiais, bem como de componentes e ferramentas específicas. Entenda-se que o cabo de um fieldbus transmite dados de acordo com
as características do meio físico utilizado (frequência, impedância, etc.) e dependendo destas características ele precisa ter uma construção diferente - por este motivo os cabos precisam ser especiais para cada tipo de fieldbus.

Marcos Fonseca, gerente sênior da Accenture, lembra que os cabos são diferentes porque cada rede já nasce com sua especificação de meio físico. “A rede AS-i, por exemplo, foi inventada com cabo chato polarizado, de dois fios, feito de tal forma que se torna impossível invertê-lo no campo (filosofia Poka-Yoke)”. As vantagens da fibra óptica são a maior imunidade a ruídos e as distâncias a que se consegue chegar com as informações; em geral os fieldbuses utilizados em plantas de processo têm distâncias pequenas, mas ainda assim existe um grande uso da fibra óptica devido a sua imunidade a ruídos.

Então, o próximo passo foram as redes baseadas em Ethernet industrial – Profisafe, HSE, EthernetIP, etc. e o wireless foi um passo natural. As plantas usam os buses para melhorar produtividade através de medições mais precisas das condições de operação: o tipo de comunicação que se estabelece com os fieldbuses gera maior produtividade e confiabilidade. A grande vantagem dos buses seria o acesso às informações de diagnóstico – os instrumentos de campo requerem calibração e verificação periódicas e os buses podem ajudar de duas maneiras nisso. Primeiro, eles dão acesso aos parâmetros que indicam quando a calibração ou outra ação é necessária nos elementos de campo.

Depois, os buses permitem calibração e coleta de dados local e remotamente, automaticamente – evitando erros e dando mais segurança às pessoas. E as redes de buses podem se ligar a bibliotecas que alimentam o sistema de gerenciamento do ciclo de vida dos instrumentos e do próprio sistema. As informações também alimentam a manutenção preditiva. Com o 4-20mA os operadores tinham que reagir aos acontecimentos; agora os buses disponibilizam ferramentas que predizem possíveis problemas, podendo evitar catástrofes.

Infelizmente, não existe no Brasil levantamento estatístico sobre a utilização dos protocolos de comunicação. Constantino Seixas, CTO da Accenture, afirma que é preciso uma entidade isenta que tenha confiança dos usuários e fornecedores para fazer esses levantamentos. Em nível internacional, as fornecedoras notificam a quantidade de equipamentos que venderam ao mercado; no Brasil a
Abinee faz levantamento semelhante de forma macro, não classificando por tipo de protocolo. “Os protocolos são normatizados por uma
entidade internacional, e isso significa que existe um padrão publicado, um documento.

No caso do OPC, por exemplo, existe uma normatização e quando se quer fazer um produto compatível, segue-se a especificação; a OPC Foundation não certificava produtos e algumas empresas lançaram pacotes com compliances que geravam certificados de mais ou menos aderência ao padrão – porque não se precisa implementar 100% da norma, o produto pode não implementar por exemplo um conceito de array (que lê maior quantidade de informação). Mas a OPC Foundation
percebeu que era desejável que ela mesma certificasse também, e passou a fazer isso”, exemplifica Constantino. Quando uma entidade define um protocolo está mais preocupada em garantir a interoperabilidade dos instrumentos do que certificar seu uso.

Quem faz certificação para aplicação são entidades ligadas a indústria; seria candidata a isso a ANP no setor de petróleo por exemplo, para garantir que todas as aplicações ligadas a sua área atendessem a requisitos mínimos, sugerindo uma lista de protocolos homologados para utilização no setor de oil & gas, por exemplo, como está acontecendo na tecnologia de smart grid, onde estão fazendo um levantamento para saber quais protocolos poderiam ser usados com interoperabilidade. Um grupo ligado ao smart grid contratou o National Institute of Standards and Technology – NIST para fazer um estudo completo, incluindo um levantamento dos protocolos que poderiam ser usados no setor.

Isso gerou um relatório que listou vários protocolos indicados/ desejáveis, mas que requerem homologação. Mesmo o OPC UA, padronizado, prestes a se tornar uma norma IEC daqui a um ano, aparece apenas como possibilidade de protocolo a ser usado, como uma alternativa interessante. Mas o NIST não homologou nenhum deles (veja exemplos de tabelas do trabalho do NIST na próxima página), apenas listou possibilidades...

O NIST elaborou vários levantamentos para ajudar o grupo do Smart Grid, como o Guide to industrial control systems security, com várias arquiteturas possíveis. “Esse cuidado com o smart grid é uma postura nova. O estudo da proteção intrínseca aos protocolos, detecção e correção de erros que funcionam em determinadas situações é importante, mas vale lembra que a aplicação é crítica. Pode-se ter um protocolo perfeito, mas que num sistema diferente, se integra criando falhas de segurança”, comenta Constantino.

Isso porque qualquer tecnologia pode ser uma solução para A e não ser para B. Quando surgiu o OPC, por exemplo, o mercado tinha dúvidas se ele teria velocidade e performance suficiente para aplicações mais críticas. A experiência hoje é que ele se comporta de maneira bastante confiável para muitas aplicações, mas o setor elétrico, por exemplo, tem seus protocolos típicos, bem como o setor de aviação e assim por diante. Segundo Augusto Pereira, gerente de Marketing da
Pepper+Fuchs e da Foundation Fieldbus no país, o market share para os protocolos deve ser analisado “por tipo de mercado, o que nos leva a acreditar que o FF predomina nos mercados de química, petroquímica, óleo e gás; o Profibus DP, nos mercados de CCMs inteligentes na mineração, etanol, papel e celulose – com algumas iniciativas recentes em química, petroquímica, óleo e gás.

Já o Profibus PA domina nos mercados de mineração e etanol, sem nos esquecermos das indústrias de origem alemã de qualquer mercado! O DeviceNet predomina onde a Rockwell Automation vende seus PLCs, na indústria automobilística e máquinas de manufatura. Quanto ao Ethernet, devemos entender que seu uso está crescendo mas não para a instrumentação e sim para a interligação de SDCDs e PLCs e também com a chegada da Norma IEC 61850, para aplicações em CCMs e subestações de elétrica. O Modbus vem perdendo espaço para o Profibus DP e o Ethernet devido a baixa velocidade e quantidade de nós por segmento, 31”. Augusto frisa que o 4-20 mA + Hart ainda é muito utilizado, principalmente quando o cliente é conservador pois apresentam menos riscos e menos treinamento.

Marcos Peluso, especialista da Emerson Process, pede, contudo, cuidado com as incompatibilidades entre o Hart 7 e as versões anteriores. “Implementar qualquer um dos fieldbuses pode gerar frustração quando não se alinham as expectativas da tecnologia com as dos usuários; quando se escolhe mal o tipo de bus; quando a escolha gera incompatibilidade entre o sistema de controle e o sistema de gerenciamento de informações; quando se subestima a complexidade da tecnologia e quando se subutiliza as capacidades do bus”, ressalta Carlos Fernando Albuquerque, da Siemens.

O melhor caminho talvez seja aquele tomado pela Deten, pioneira na utilização do fieldbus foundation: começar com uma rede isolada num laboratório ou, como foi o caso, na área de utilidades. Utilizar um bus assim é bom para aprender a lidar com a tecnologia e pegar os macetes de algumas conexões inter-marcas. Ir acrescentando instrumentos é um jeito de vivenciar uma característica dos buses que não existe no 4-20mA: eles são feitos para se expandir. E então, quando houver mais segurança, implantar os buses em larga escala trará, de certo, benefícios em larga escala.

Carlos Fernando lembra que os buses possuem características e ferramentas bem diferentes do 4-20 e pedem treinamento. As novas redes pedem modelagem e testes de performance da própria rede, das malhas, dos cabos, com atenção especial à parte elétrica e suas interferências. Um erro comum é a má distribuição de nós e spurs.
Então, o conhecimento do usuário é desejável, mas a escolha do parceiro é determinante para o sucesso da implementação. Inclusive para saber que alguns instrumentos podem se ligar diretamente aos sistemas de TI, reduzindo custos dos equipamentos e softwares intermediários.

Isso porque algumas aplicações não pedem atualização de milissegundos ou comportamento determinístico – em algumas instalações a maioria dos instrumentos não está associada a funções de controle em tempo real. Há dez anos, a maior justificativa para se implantar um fieldbus era que ele usava menos cabos; outra justificativa comum para todos os buses é a cultura de gerenciamento
de ativos – e a economia - em não repor partes que não precisam ser repostas, trocar instrumentos que vão apresentar defeitos antes de um problema - é grande, mas não é o suficiente para convencer pelo payback num projeto brownfield. Para os greenfield, menos cabos, menos manutenção e rápido comissionamento podem ajudar a vender a idéia.

Os primeiros usuários chamam a atenção para o fato de que estar on line permanentemente pode ser a maior justificativa porque essa condição traz um conhecimento do processo e da planta jamais imaginado. E os buses todos trazem muitas melhorias, com excelentes perfomances se bem aplicados, como mostra a tabela que resume um trabalho realizado na África. Deveriam influenciar no processo de escolha a engenharia, a instalação e a operação, que não quer apenas
saber qual a temperatura ou a pressão que o transmissor está lendo, quer tirar o máximo desse transmissor, enquanto as informações de calibração que possam não ser vistas de tempos em tempos, ficam armazenadas no instrumento, à mão para quando for preciso.

E o bom da tecnologia é que ela está sempre nos oferecendo mais. Os buses foram atrás de incluir em seus repertórios as necessidades de segurança, os desejos de uma ligação mais familiar com a TI para criar
suas versões Ethernet, a dificuldade de vencer as longas distâncias com o wireless... Ainda não são todos interoperáveis e plug´play, mas estão trabalhando para isso, num esforço que, se encontra revezes comerciais, tem tudo pra dar mais que certo, numa fórmula que se pode resumir como ECT (EDDL Cooperation Team)+FDT+OPC=FDI.

Mas Carlos Fernando Albuquerque, da Siemens, lembra que os protocolos não têm nada a ver com os formatos de arquivo para gerenciamento de ativos. Então, na prática, tanto EDDL quanto FTP podem ser utilizados por qualquer protocolo – ressaltando que no caso do FF em particular, ele usa EDDL para a configuração da rede. Mas nem todos os fabricantes suportam os dois. Uma comparação típica seria: usar milímetro ou polegada? A medida é a mesma, mas essa diferença acaba obrigando os usuários e mesmo os fabricantes a ter duas chaves, no mínimo.

Vale lembrar que a razão de existir do grupo FDT é esse padrão e ele vai continuar a existir. “O FDT Group apóia a FDI porque é uma demanda do usuário, mas deve continuar com versões do FDT as mais parecidas possíveis do FDI para que, se houver uma demanda de maior compatibilidade, ele se encaixe sem maiores problemas. Essa é a idéia, mas a gente só vai ver se isso funciona mesmo quando os primeiros interpretadores e produtos FDI saírem... daqui a alguns meses”, pontua Carlos Fernando.

Constantino lembra que a topologia também gera preferências e é uma limitação inerente a cada rede, cada uma tem sua vantagem e desvantagem. “O padrão Ethernet, por exemplo, nasceu como barramento, mas hoje possibilita diferentes possibilidades com os switches. E todos os protocolos criaram topologias compatíveis com a Ethernet. Em qualquer protocolo de última geração, se pode criar uma topologia equivalente. A tendência é que migrem para Ethernet e assumam suas características de topologia”.

Segundo Augusto, na questão topologia, a única tecnologia de protocolo que possibilita hoje a descentralização do controle é a Fieldbus Foundation, pois neste caso pode-se escolher manter um controle centralizado no PLC ou no SDCD; todos os outros buses precisam ter um controle centralizado e com isto o segmento fica sendo somente utilizado como um via de transporte de informações bidirecional. O desempenho de um controle passa pela correta escolha do protocolo para o tipo e para as demandas de uma aplicação especifica.

A questão de segurança é tratada por normas especificas como a ISA S84 e mais recentemente pelas IEC 61511 e FFSIS, nem todas prontas. É uma questão de tempo que os buses todos tenham também SIS. E ainda FISCO, FNICO... Não é mesmo uma decisão fácil. Em geral a tomada de decisão de se desenvolver um projeto com uma ou outra tecnologia é feita a pelo menos duas mãos: o usuário e o projetista. Nesse momento é preciso ter muita calma e fazer um estudo profundo, levando-se em consideração que um projeto que está se iniciando hoje deve atender as demandas de produção de uma planta para os próximos 20 ou 30 anos. “As técnicas de controle de processo e de manutenção devem ser pensadas neste sentido”, frisa Augusto.

A análise é bem mais ampla do que optar por uma tecnologia ou uma solução, a utilização de um ou mais protocolos deve ser pensada como uma decisão estratégica para a empresa. “Em minha opinião, nenhuma razão técnica sustenta o uso de 4-20 mA hoje em dia nas plataformas de petróleo, por exemplo. Podemos ver nos dias de hoje como o controle do processo de extração numa plataforma é perigoso e a automação e a instrumentação desde que bem utilizadas com seus protocolos digitais podem ajudar a aumentar a qualidade e a segurança do controle da plataforma”, comenta Augusto.

A saída para grandes parques rodando no 4-20 mA seria então o Hart, que facilitaria a entrada desses sites na “modernidade” via WirelesHart? Carlos Fernando lembra que o wireless sozinho não muda nada no mercado de protocolos tecnicamente falando porque os padrões de rede e os padrões de gerenciamento de ativos são coisas diferentes. “Os padrões de gerenciamento de ativos usam serviços dos
padrões de rede para fazer o acesso aos ativos: havendo serviço, tudo funciona. O WiHart não pede nenhuma modificação sensível nessa disputa e até mesmo pelo fato dele ser baseado no Hart, os serviços desse protocolo aceitam EDDL e DTM – é só garantir que o gateway que lê o WiHart se comunique com a ferramenta do gerenciamento de ativos.

Do mesmo modo o ISA 100. O wireless é uma rede em paralelo aos FF, Profibus, etc.”. No caso do novo wireless chinês, seu peso é que os fornecedores terão que incluí-lo no portfólio para atender o mercado chinês – extrapolar isso ainda não. A China ainda não tem força como fornecedora, mas tem como compradora. O bom disso é
que a Hart Foundation já está montando laboratório na China para trabalhar em conjunto com o instituto chinês responsável pela norma daquele país.

O Hart pode, por exemplo, ser encapsulado no Profibus que tem mecanismo padronizado e tanto processa informação cíclica quanto acíclica. No WiHart o vínculo nãoé feito no nível do Profibus; o gateway do WiHart se comunica diretamente ao SDCD e não há uma relação direta Profibus/Wireless, não existe um Proxy Profibus/WirelessHart. Tanto um como outro se conectam direto a CPU, ao SDCD. O máximo que se pode compartilhar é um barramento Ethernet para que o gateway fale diretamente com o sistema de controle. “O sistema de controle acaba sendo um guarda chuva pra tudo que está embaixo, no campo.

Então, quanto mais buses e tecnologias um sistema de controle é capaz de suportar de forma nativa mais ele simplifica a vida. Mas, para maior confiança na escolha de um ou outro protocolo, é interessante visitar as Plantas de Referências e apresentar um estudo de ganhos”, comenta Carlos Fernando. A cultura de uso é um fator primordial nos diversos segmentos e alguns são mesmo mais tradicionalistas que outros, como o de papel e celulose – que também começa a inserir as novas tecnologias, como por exemplo os projetos da Voith Paper que é pró ativa em oferecer as vantagens de novas tecnologias com garantia.

Os prazos muito curtos para a execução dos projetos – que têm que se pagar rapidamente – pode ser uma das causas para que os epcistas evitem incluir novos conceitos. A cultura de gerenciamento de ativos tem papel fundamental na expansão do uso dos protocolos (FF, Profibus, etc) porque mostra que o 4-20mA, apesar de confiável e conhecido, torna a manutenção cega sem um Hart, por exemplo.

“A escolha de protocolos é um assunto tão importante e frequente no meu dia-a-dia que eu lancei um novo curso, “Análise comparativa dos protocolos digitais para aplicação em projetos de automação” onde eu trato de todos os detalhes dos protocolos mais importantes e como se pode chegar à escolha mais adequada de um determinado protocolo para uma determinada aplicação”, diz Augusto Pereira.



 
 
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